Cumulus — ou a nuvem mais pesada
21.11 - 20.12.2024
O projeto “Cumulus — ou a nuvem mais pesada” (2023-24) consiste numa colaboração artística entre os artistas David Lopes e Fábio Araújo.
Uma performance serviu como ponto de partida e orientou um projeto expositivo que se desenvolveu através de uma prática multidisciplinar. Esta performance procurou seguir um percurso histórico pela cidade do Porto, tendo-se desenrolado ao longo das linhas militares das baterias das tropas miguelistas e do exército dos liberais, durante o Cerco do Porto. Realizada por Fábio Araújo, o performer envergava uma farda militar e carregava às costas uma chapa de metal — uma estrutura-mochila, como os artistas lhe chamam. Na superfície de metal estava impressa uma secção de um desenho de João Baptista Ribeiro (1790-1868) que foi professor de desenho na Academia Politécnica do Porto, instituição que precedeu a Universidade do Porto. Este desenho constitui uma reportagem gráfica dos bombardeamentos sobre a cidade durante o Cerco do Porto, podendo identificar-se elementos arquitectónicos icónicos como o Convento da Serra do Pilar e a Torre dos Clérigos. No céu surgem representações de nuvens com a inscrição da palavra “bomba” ou a sua abreviatura, “b.”.[1]
A filosofia desenvolvida por Didi-Huberman em torno da montagem do Bilderatlas de Aby Warburg influencia o projeto, trazendo para discussão a imagem do titã Atlas que na mitologia grega é condenado a suportar o “peso dos céus”. Assim, o soldado é também pensado como um Atlas a quem é confiada a responsabilidade de carregar o peso do mundo no contexto de guerra. O registo de uma ação como o caminhar pelas linhas do Cerco do Porto na relação com o desenho de João Baptista Ribeiro sugere uma reflexão sobre dualidades. A primeira dualidade é estabelecida entre o espaço urbano da cidade e o mesmo espaço em tempos de guerra; a segunda, entre o percurso cartográfico dos pontos estratégicos das baterias do século XIX e a atual transformação urbana do Porto; por fim, a dualidade entre a imagem fotográfica de uma nuvem e a desenho de uma bomba. Estas dualidades, que promovem diversas interpretações e convergem numa preocupação central: a vulnerabilidade humana em tempos de guerra.
O ato performativo é também uma tentativa de trazer a arte contemporânea para o diálogo com a história da cidade do Porto. Ao evocar no presente um período de conflito e destruição, a performance propõe uma reflexão sobre como a arte pode contextualizar o passado, iluminando as transformações da cidade e a sua relação com os momentos de crise. Este gesto convida-nos a refletir sobre o impacto da guerra não apenas no espaço físico, mas também nas narrativas que moldam a identidade urbana e coletiva.
[1] https://gisaweb.cm-porto.pt/units-of-description/documents/300223/?q=ribeiro+cerco+do+porto
Organização: INSTITUTO, paulo moreira architectures
Apoio:FBAUP, FCT, Direção-geral das Artes, Oficina Mescla, Pure Print, oBastidor
Créditos fotográficos: Marc Goodwin